segunda-feira, 16 de março de 2015

Eu (não) quero mudanças


Enquanto fico sentado e calado, ouvindo o que os revoltosos tentam me fazer acreditar, apenas essas palavras conseguem sair da minha mente. Eu sou um idiota, que não quer se meter em nada, que não tem opinião, que está vendo o seu país morrer aos poucos.

Não demonstrar interesse na mudança do país não parte de um princípio de apoiar A ou B para ocupar uma certa cadeira em um certo local. Não importa quem chegue na frente, o mundo vai continuar livre. O mesmo idiota que vota em A, não votaria no B da mesma forma que o idiota do B não votaria no A – enquanto mantém a sua Guerra Fria com ofensas e ataques.

Vivemos em um mundo recheado de inverdades, onde é mais válido denegrir a imagem do próximo do que exaltar as qualidades do ser humano. Os donos da verdade acabaram de ter um orgasmo.

Esses verdadeiros donos da verdade, e de todo o poder filosófico de opinião, consideram-se Reis ou Rainhas da sociedade, se achando no direito de reprimir todo o mundo, que uma vez achou o seu ideal – um pouco – diferente, daquilo que os nossos espíritos foram acostumados a sentir. Não é que julgue certo ou errado, o mundo é livre, e todos têm o direito de fazer o que quiser.

Nos dias que seguem, eles entopem o mundo com o seu idealismo (correto, é claro, eles são os donos da verdade) – barato – e exaltam o poder da luta, da revolta, como instrumento da mudança. Mudança para quê? Eu respeito todo mundo que acredita nisso, e luta por isso, mas não respeito aquele que vem atacar o que não quer mudança. Mudança. Que palavra!

Esse mundo é movido pela palavra “mudança”. Já perdi as contas de quantas propagandas eleitorais assisti onde prometiam mudança. Até a mudança já cansou de tanta mudança. Entra A e sai B. O mundo continua como está. Isso abre espaço para uma única mudança – com o trocadilho –, devemos mudar as pessoas do nosso país. Não no sentido de expulsar todo mundo, mas no sentido de mudar a filosofia de cada um.

O idiota que não pensa e o revolucionário dono da verdade viveriam muito melhor em um país menos corrupto, isso é fato. Mas, a corrupção não parte da mudança proposta pelo candidato A ou B, ou pelos – in memoriam – partidos políticos. Ela parte da cabeça de cada um. Todos os seres humanos são bons e capazes de produzir o bem maior com sua força de vontade. O que diferencia um Presidente da República de um mendigo é uma linha quase invisível. É claro que numa sociedade desigual, o Presidente teve muito mais oportunidade de adquirir novos conhecimentos do mundo, mas, como ser humano, somos todos iguais.

A máquina que move o mundo é abastecida por corrupção há muito tempo. O sistema viciou e corrompeu o espírito de todos que chegam perto dele. Como um pelotão de ciclistas em uma corrida, ele engole aqueles que tentam se distanciar dele. O sistema move o mundo. O sistema (não) muda o mundo.

É por isso que não perco minha força postando cartazes e levantando a mão para A ou B, nessa eterna corrida presidencial. Eu tento viver o melhor que eu posso. Sei que não terei mudanças. Mas, a mudança dentro de mim já começou. Se um dia ela atingir o meu vizinho, e assim por diante, como uma progressão geométrica, A ou B serão um só – o idiota e o revolucionário também. Todos seremos moradores da mesma terra livre, com um único propósito: viver o melhor que podemos. Eu quero essa mudança. Viva o melhor.

segunda-feira, 9 de março de 2015

Finalmente adentrando no Jardim Secreto


Depois de muita espera, eis que pego minha cópia do Secret Garden (2015), mais novo álbum dos guerreiros do Angra. Digo "guerreiros", porque eles passaram por muitas situações que culminaram ou culminariam no fim da banda, e eles continuaram. Sem querer criticar e já criticando, o problema de tudo foi dinheiro. O dinheiro tirou Andre Matos da banda, para a sua carreira-solo quase sem sal; o dinheiro tirou Aquiles Priester, que formou o Noturnall e continuou com o Hangar e o dinheiro quase levou a banda toda embora, quando um problema de longa data com um dos empresários da banda deixou o Angra fora dos palcos por certo tempo. Esse tempo de hiato serviu para Edu Falaschi se dedicar ao Almah, e deixar a banda (foi o melhor, não dizendo que ele é ruim), para Kiko Loureiro se dedicar à sua carreira-solo e para Rafael Bittencourt lançar o Brainworms I (2008), um dos melhores álbuns que escutei até hoje, sério mesmo.

Depois do conturbado DVD em comemoração aos 20 do Angels Cry (1993), que provocou mais brigas entre os membros antigos, brigando por direitos autorais -- novamente o dinheiro entrando em pauta -- eis que o Angra volta para o estúdio e nos apresenta mais um trabalho. A principal novidade do Secret Garden (2015) é a presença de Bruno Valverde na bateria e Fábio Lione nos vocais, dispensa apresentações.
capa expandida do Secret Garden (2015).
Pegando o meu álbum, gostei do acabamento, detalhe para a versão digipak -- não sei se será limitada. Artes que remontam um jardim e fotos da banda tiradas no Museu da TAM, em São Carlos/SP, estão em perfeita harmonia. Aprovado o trabalho artístico, vamos ao que interessa, que são as músicas.

Em se tratando de Angra, a primeira coisa que esperava era um "arroto" em dueto logo na primeira música, e passagens puramente técnicas, como é o costume. Mas, Newborn Me é um tapa na cara de quem tem esse sentimento. Nada de riffs rápidos e em dueto, um único riff pesado é que introduz a música, lembrando os bons tempos de Nothing to Say, no Holy Land (1996). Os vocais de Fábio se encaixaram perfeitamente na música, gostei do resultado. O refrão é excelente, ao vivo ficará poderoso. Outro detalhe é que o Angra não se adapta aos vocalistas, os vocalistas é que devem se adaptar ao Angra. É comum você ver uma banda mudar um pouco o estilo depois que um novo vocalista entra. Tive esse sentimento porque fiquei imaginando Edu Falaschi ou Andre Matos cantando a mesma música, são estilos semelhantes. 

No melhor estilo Acid Rain, do Rebirth (2001), Black Hearted Soul é a segunda faixa do álbum, e para quem achou que eles não chegariam, ali estão eles, os solos em dueto na introdução seguido de uma base rápida estilo speed metal. Refrão pegajoso, é uma música no estilo que o Angra sempre trabalha. Como achei o álbum muito rico -- já adiantando meu julgamento -- essa música meio que passou despercebida, mas, não deixa de ter seu charme. Final Light, uma das contribuições de Felipe Andreoli, é uma das minhas favoritas do álbum, o início pesado e o refrão potente são um convite a apreciar o Secret Garden (2015). Não consigo imaginar essa música sendo executada no show, mas é um dos pontos fortes do álbum, com direito até a percussão.

Storm of Emotions foi a música lançada como single e única música que já tinha escutado do álbum antes do lançamento. Início lento, com progressão para um refrão marcante. A principal parte dessa música para mim é quando Rafael canta. Podemos contar no dedo as vezes que ele fez uma participação em um álbum do Angra, e quando ele entra, entra "entrando". Ficou apoteótico. A partir desse ponto, temos sua participação cada vez mais nas músicas, o que achei sensacional, porque ele nos mostrou que o Angra não vai ficar preso mais a vocalista. O Fabio é da banda? É, mas, desde o início ele deu a entender que poderia sair a qualquer momento da banda, e em uma possível saída, Rafael poderia finalmente assumir os vocais do Angra, algo que deveria ter feito desde a saída de Andre Matos. Ele já mostrou sua competência, o único problema é sustentar com o ritmo dos shows.
Angra, da esquerda para a direita: Felipe Andreoli, Rafael Bittencourt, Fabio Lione, Kiko Loureiro e Bruno Valverde.
Algo que notei nesse álbum é que as músicas não estão difíceis para o vocalista. Se você analisar o Fireworks (1998) ou o Temple of Shadows (2004), por exemplo, são álbuns extremamente difíceis, mas, o Secret Garden (2015) deu a impressão de ter sido composto dentro do alcance vocal de Rafael. Mais uma de minhas favoritas, Violet Sky, é a faixa seguinte, cantada inteiramente por Rafael. A música segue mais ou menos a mesma linha progressiva de Storm of Emotions. Apesar de Fabio ser o vocalista -- agora oficial --, ele não cantou todas as músicas, como é o caso dessa. Isso deu uma versatilidade muito grande ao álbum.

A faixa-título Secret Garden, única faixa que não foi composta pela dupla Bittencourt/Loureiro (quase um Lennon/McCartney) e sim pela esposa do Kiko Loureiro, Maria Ilmoniemi. A música é diferente de todas as composições do Angra, obviamente, e de todas as músicas do álbum. Ela é inteiramente cantada por Simone Simmons (Epica), mantendo seu timbre natural de voz, não fazendo a "voz de opera" tradicional. Gostei da música. Têm muitas passagens de violino, obviamente 2 (a esposa do Kiko é violinista e pianista), e é a faixa mais orquestrada de todas do álbum. Novamente digo, é diferente de tudo o que apareceu antes em toda a discografia do Angra. Foi ousado colocar uma música dessas no álbum, mas, para mim, o resultado não podia ter sido melhor.

Com um riff no baixo, seguido de uma levada bossa-nova, Upper Levels nos "traz o Angra de volta". Essa música nos lembra das raízes brasileiras da banda, algo que eles sempre tentam trazer nos álbuns. Musicalmente, é uma das melhores do álbum, cheia de variações na melodia. Fabio acaba seu descanso e volta aos vocais nessa. Essa é mais uma música para você parar e ouvir. Arrisco em dizer que essa é um dos pontos altos da carreira do Angra, não dizendo que ela será um clássico, mas, é uma das melhores composições que eles fizeram. Depois da pesada, porém um pouco apagada, Crushing Room, cantada por Rafael -- com direito a participação da clássica Doro Pesch, nos vocais -- o álbum é "encerrado" com a rápida e fácil de ouvir Perfect Symmetry. Esta última segue a linha dueto na introdução e base rápida em pedal duplo, era a música que o álbum precisava ter, a ousadia já foi muito grande com as outras faixas. Mesmo sendo "mais do mesmo", gostei da música, principalmente do início do refrão: "Stars are calling you...". Novamente, imaginei a voz de Edu Falaschi nessa música, mas, perdão, Edu, o Fabio está muito bom.

Anteriormente falei "encerrar" entre aspas porque essa música é a última rápida, mas, o Secret Garden (2015) ainda guarda uma música para fechar a obra. Uma faixa inteiramente voz e violão, composta por Rafael, encerra a visita ao jardim secreto. Silent Call é de longe a minha favorita do álbum. É uma música extremamente simples, mas, que soa muito bem. Rafael cantou ela com uma alma tão grande, que ainda não consigo mensurar. Recomendo fortemente você, web-leitor, conferir essa música. A letra também é um show a parte. Uma mensagem positiva forte é transmitida. Foi o encerramento que esse álbum merecia, sem sombra de dúvida.

Terminando a audição do Secret Garden (2015) fiquei com a impressão que o Angra nos convidou a entrar nas raízes mais ocultas de sua criatividade. Se álbuns como o Aqua (2010) e o Aurora Consurgens (2006) são extremamente técnicos, o Secret Garden (2015) é musical. Composições simples, mas, complexas ao mesmo tempo, sem ter a obrigação de serem difíceis de tocar, como eram as composições do Angra. Se eu já tinha gostado do Aqua (2010), o Secret Garden (2015) está muito à frente dele. Já considero ele entre os cinco melhores de toda a carreira do Angra. É um álbum de estúdio, não consigo imaginar boa parte das músicas ao vivo, é um álbum para você escutar em casa, sentado no sofá com uma Heineken, apreciando cada acorde.



P.S: Algo que me ocorreu no fim da postagem é se esse álbum tem ou não ligação com o livro O Jardim Secreto, de 1910. A banda não se pronunciou a respeito, mas, vou analisar as letras e ver a obra para verificar a relação, e publico posteriormente. O Aqua (2010), para quem lembra, foi inteiramente escrito baseado na Tempestade, de Shakespeare. Vamos aguardar.